24 de setembro de 2011

A essência do Yoga

Ouça e para sempre guarde no seu coração:
— « Para se perceber é preciso esquecer aquele que te percebe.
Para entender a si mesmo é preciso esquecer aquele que te entende. »

E te revelo agora a prática do meu ensinamento:
— « Desaprender quem te entende e percebe é alto.
Mas estar além de quem percebe e entende é a jóia suprema. »

9 de setembro de 2011

No embalo das leituras

A ortodoxia sempre falou mais alto que a amizade.

Calvino, por exemplo, excomungou Sebastião Castellion por ter interpretado os « Cantares » de Salomão literalmente. Já é lugar comum: para alguns tipos é sempre complicado falar nas expressões do amor erótico. É embaraçoso pensar na sacralidade do amor concreto. É sempre mais fácil nos escondermos na alegoria do amor abstrato de deus pelos homens. E mais cruel também.

8 de setembro de 2011

Névoas



Confesso saborear com prazer o fumo entre os dedos, o ambiente que pouco a pouco de fumaça se satura. Penso que cada cigarro traz consigo uma medalha que se apaga, uma lembrança que galopa e se perde. Há em cada fumo a amenização das nossas mais brutais humanidades.

Há momentos assim, rápidos, fatais, inesperados



Porque a moda não é para o corpo apenas. Serve também para consolar nossos ouvidos, acariciar os sentidos e nos enredar em tudo aquilo que nos é humano. Porque das poucas posses trazemos, carregamos sempre aquilo que é indiferente ao tempo, ao instante que passa e nos devora a carne.

27 de agosto de 2011

...

« Essas rosas sob minha janela não fazem referência a rosas anteriores ou melhores: elas são pelo que são » — Ralph W. Emerson

De tudo quanto passa e fica, doce aquele que se rende. E por não saber o que dizer, jura por sinais que se ampliam e dissipam. Consciente de si, em busca de uma língua que se oculta e o determina, sobre si mesmo os caminhos se revelam e se sucedem. Em si mesmo nasce o começo e o fim, sendo livre em meio à pureza irregular da harmonia. Qual a natureza da experiência, dos afetos pensados e amores sentidos? Qual força ou imprudência revelar-nos-ia o amor? Em tudo há seu oposto e afirmação. Tudo obedece uma mesma lei e destino. Nada lhe é alheio. Cada grão, toda individualidade e cosmo sobrevivem a um mesmo hino cantado. E por um breve momento temos a visão de campos e homens entardecidos.

Ralph W. Emerson | Brahma

26 de agosto de 2011

Assim como eu e você

25 de agosto de 2011

Saber-se no aqui, sozinho, de mãos dadas



Torna-nos a morte mais delicados e preciosos. E das mortes que morremos, peixes e serpentes abandonadas na memória, somos sempre estranhos àquilo que despedimos. Não há sentimentalismo. Tudo é falível e fatal. Todo sacrifício jamais poderá senão se concentrar no presente, no ato de herói ou de derrota, pois não é menos estranha a loucura que consagra um esforço que ninguém estimula? Profundo é o que nos envolta no vazio e claridade. De que nos adianta buscar a Verdade se não queremos a pureza dos atos concretos, na observação concreta, na sensibilidade concreta?

« Heard melodies are sweet, but those unheard are sweeter »

« O Homem real, o Espírito, não pode ser ferido por armas, nem queimado pelo fogo; a água não o molha, o vento não o seca nem move » — Bhagavad Gita, II, 23.
Quando olho para uma nuvem que passa ou para o rio que sob meus pés flutua, não há qualquer obstáculo nos meus pensamentos. Assim como a nuvem que se dissipa ou a água que se perde entre as margens que a aprisiona, com eles sou um, a causa e a circunstância, o dínamo e a embriaguês. Então, por um instante, não há motivo para viver num mundo de inesgotáveis existências. E nesse fluir, à semelhança das percepções, das carnes e daquilo que permite a vida e também a colhe, tudo cessa. Nada se afirma por palavras, mas pela própria coisa sentida. Nada se adia ou recorda; e brevemente vive-se acima do tempo e da morte.
Tendo eu estacionado a atividade nesse domínio e seguido por linhas outras que não essas, assumo agora — como ato de uma cena que se nega abaixar os panos do encerramento — a responsabilidade de continuar esse espaço de poética e deslumbramento. Agradeço particularmente ao amigo João Ferreira Dias pelo estímulo sempre incansável e ao blogger Rui Bebiano por manter esse blogue entre os de sua preferência, mesmo sem há muito cá não escrever.

20 de março de 2011

Por que haveria de ser sempre assim?



Há muito não escrevo. Se de tudo quanto leio algo aproveito, mero acaso se trata, e as palavras parecem não combinar. A força, num tempo onde nada parece se preservar, não me serve ou estimula. As cores esvaecem-se. E eu, como filho bastardo de um poema que se nega escrever, vago por aí. De que me serve pensar se a voz me recusa? Qual a serventia do pensamento quando o próprio pensar de mim se exclui?

19 de março de 2011

cinco vezes em luz, cinco apagado

17 de março de 2011

Time after time

Há dias assim, vividos como um breve sussurrar entre os dentes.
Não há corpo que aguente; e não há felicidade que resista.

Percy Shelley, « The Masque of Anarchy »

6 de março de 2011

O pensar da rebelião



The development of the individual subject is directly linked to the history and prehistory of capitalism: the isolated individual emerges along with and because of capitalism. However, this is the source of a major contradiction in modern society, for the individual whom society has created cannot help being frustrated in the attempt to live in that same society and ends up revolting against it. The Romantic exaltation of subjectivity — wrongly considered as the essential feature of Romanticism — is just one of the forms taken by the resistance to reification. Capitalism gives rise to independent individuals who can carry out socioeconomic functions; but when these individuals evolve into subjective individualities, exploring and developing their inner worlds and personal feelings, they enter into contradiction with a universe based on standardization and reification. And when they demand that their imagination be given free play, they collide with the extreme mercantile platitude of the world produced by capitalist relations. In this respect, Romanticism represents the revolt of repressed, channeled, and deformed subjectivity and affectivity.

— « Romanticism Against the Tide of Modernity », Michael Löwy e Robert Sayre, p. 19

1 de março de 2011

Canções que apetecem-me a noite, § V

27 de fevereiro de 2011

Return to the source of light

Realismus



Passo pelas muralhas e reconto
Os alicerces de uma casa e o ponto
Onde a árvore, como um dedo sujo duplo, sai do chão,
E solto a imaginação.
À luz do dia declinante apelo às
Memórias e retinas
De antigas árvores ou ruínas —
Que eu gostaria de inquirir a todas elas.
William Butler Yeats

Zen

Meu dilema:
Aquela profunda realização nunca
Virá acontecer à
Minha mente, cuja verdade
Ela tão bem realiza.
— Saigyo, « Poemas da cabana montanhesa »

20 de fevereiro de 2011

poemacto



— Herberto Helder, « Ou o poema contínuo », Ed. A Girafa, 2006, p. 206-207